Rescisão de Jean no São Paulo é um lembrete social, é um problema nosso. Temos que debater!
Toda vez que isso acontece, e que um caso assim vem a público, sinto meu estômago embrulhado. É um misto de sensação de indignação com o sentimento de impotência por saber que, simultaneamente, outras situações idênticas e ainda mais terríveis estão acontecendo. É desesperador!
Enquanto escrevo esse texto, uma mulher está sendo agredida no Brasil. Para ser mais exata, mais de 500 mulheres são agredidas a cada hora (segundo o Datafolha). Conforme processo cada ideia que quero expressar nas linhas seguintes, haverá uma mulher violentada no país que vai decidir, mesmo agonizando em sua mais profunda dor, relevar a agressão do companheiro. Enquanto essa mulher desiste de denunciar o seu agressor, outra será assassinada. E, continuamente, sem que isso pareça um exagero de minha parte, podemos dizer que há uma guerra contínua e global em curso.
De situações que se estendem de um pequeno incidente social desagradável até o silenciamento violento, é uma sentença de morte decretada, pior que qualquer peste já registrada, epidemia ou disputa territorial/ideológica, nós, mulheres, estamos MORRENDO. No tradicional jornal norte-americano The New York Times, Nicholas Kristof, jornalista de renome, escreveu: “No mundo todo, as mulheres entre 15 e 44 anos têm mais probabilidade de morrer ou serem mutiladas pela violência masculina do que por câncer, malária, guerra e acidentes de trânsito, TUDO SOMADO”.
Só em 2018, 16 milhões de mulheres acima de 16 anos sofreram algum tipo de violência, ao se divertir num bar, no trabalho, na internet, na rua e em casa. No estudo, a violência simbólica, praticada por ofensas verbais, é também levada em consideração. E quando o agressor está muito perto? Pois 72% das mulheres vítimas de violência conhecem seus agressores - o marido, um ex-namorado, um vizinho, um familiar. Sendo que mais da metade dessas mulheres agredidas simplesmente não denuncia ou sequer chama a polícia.
Transcorridas algumas horas do caso, o São Paulo decidiu que vai rescindir o contrato de Jean.
E é o que se esperava do clube, afinal o esporte, como extensão da sociedade, não deve ser permissivo com situações assim. Da mesma forma, com o que acontece na arquibancada, como insistentemente falo por aí. O ambiente esportivo não dá carta branca para discriminação e/ou ofensas, não dá permissão para ódio e o preconceito. Na tentativa de alguns de relativizar, aqui um aviso: você que me lê, vamos entender e reiterar que a violência não é apenas aquela que deixa marca físicas. A violência passa pelas palavras e pelos insultos.
Aproveito então para recordar o que de importante tem sido feito ao se tratar de futebol como agente social. Ainda no começo do ano, o São Paulo, Corinthians e Palmeiras se uniram à Prefeitura de São Paulo apoiando a campanha “Tem Saída”, uma iniciativa pública voltada à autonomia financeira e empregabilidade da mulher em situação de violência doméstica e familiar. Em março, nas redes sociais viralizaram vídeos com trechos dessa impactante campanha que contava a história de uma mulher que sofreu abuso por longos 18 anos, colocando corintianos, são paulinos e palmeirenses na mesma página.
Em 2018, o Estádio do Morumbi, casa tricolor, abriu suas portas para uma também mega-ação acolhedora. Chamado de “SPFC se importa”, o projeto social foi uma parceria com o Justiça de Saia, chefiado pela promotora Gabriela Mansur para receber mulheres vítimas de violência e oferecer a elas tanto auxílio jurídico quanto psicológico.
Portanto, a manhã desta quarta-feira 18 de dezembro nos coloca diante de um problema que não é apenas do São Paulo como clube de futebol. Não é só do esporte. É NOSSO!
Você leu corretamente, o caso, que ainda é investigado pelas autoridades norte-americanas e que já levou a quase imediata detenção de Jean no estado da Flórida, é problema nosso. Meu e seu que me lê. Nós, sociedade, temos a responsabilidade de debater a violência contra a mulher e de tratar a morte violenta de mulheres pelo nome correto - feminícidio.
No país que ocupa a quinta posição no ranking de feminicídio mundial, atrás de países como El Salvador, Guatemala, Colômbia e Rússia, não assinemos calados essas milhares de sentenças de morte.
Rescisão de Jean no São Paulo é um lembrete social, é um problema nosso. Temos que debater!
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