Por que tem um jogador de futebol americano na fachada da biblioteca da maior universidade do México?
Grandes painéis, imponentes, com desenhos gigantescos que unem diversos elementos e personagens para contar uma história. O muralismo é um movimento artístico que surgiu no México após a Revolução Mexicana (1910-1920) e se tornou elemento fundamental da cultura do país. Vários prédios públicos são decorados com enormes murais, e um dos locais em que isso está mais evidente é na biblioteca central da Universidad Nacional Autónoma de México. Lá estão o passado pré-colombiano do México, a história colonial, o mundo contemporâneo e a universidade, com brasão, estudos e… um jogador de futebol americano?
A NFL encomendou uma pesquisa em 2015 sobre sua popularidade fora das fronteiras dos Estados Unidos. O México foi o primeiro colocado, com mais de 20 milhões de seguidores. O Brasil ficou em segundo. Não à toa, a liga já realizou dez partidas na Cidade do México. Uma delas, San Francisco 49ers x Arizona Cardinals em 2003, levou 103.467 pessoas ao estádio, maior público de temporada regular da história da NFL na época. A marca foi batida por um Dallas Cowboys x New York Giants em 2009, mas o maior público da liga em qualquer jogo ainda é do Azteca: 112.376 em um Cowboys x Houston Oilers de pré-temporada em 1994.
Esses números impressionam, mas só mostram parte da história. O futebol americano é apenas o quinto esporte mais popular do México, atrás de futebol, beisebol, boxe e basquete, sexto se considerarmos que lucha libre (também chamada de luta livre, pro wrestling e telecatch) é um esporte. Ainda assim, o futebol da bola oval tem uma longa história dentro da cultura esportiva mexicana, e isso fica muito claro na universidade.
O primeiro jogo de futebol americano realizado em solo mexicano foi em 1896, quando o time da Universidade do Texas atravessou a fronteira sul e fez uma excursão por Monterrey, Cidade do México e Nuevo Laredo. Na época, ainda nem era permitido dar um passe para frente. Essa primeira fagulha teve caráter universitário, e assim continuou. De certa forma, continua até hoje.
No esporte, a Unam é mais conhecida pelos Pumas, o terceiro clube de maior torcida do país e sete vezes campeão mexicano de futebol. Mas os Pumas não são apenas uma equipe de futebol profissional de bola redonda, também são todas as equipes esportivas da instituição em competições universitárias. E a principal delas é a de futebol americano (e aí dá para entender a presença do jogador de futebol americano no mural da foto do alto).
A partir da década de 1920, estudantes da Unam começaram a organizar partidas de futebol americano nas horas livres. A atividade foi se desenvolvendo, principalmente depois de uma forte geração vinda da Escola de Medicina. Isso incentivou a criação de um campeonato amador de clubes e, principalmente, à implementação do futebol americano no Instituto Politécnico Nacional, segunda principal universidade pública do México. Logo em sua estreia, a Politécnica venceu a Unam por 6 a 0 (os times ainda não adotavam os mascotes atuais, Burros Blancos e Pumas). Surgia uma grande rivalidade.
Inspirados pelo que ocorria nas universidades da capital, duas instituições de Monterrey, o Instituto Tecnológico de Ensino Superior de Monterrey (Itesm) e a Universidad Autónoma de Nuevo León (UANL), criaram suas equipes na década de 1940. Era o segundo grande clássico do futebol americano do México: os Borregos Selvajes e os Auténticos Tigres (como os Pumas, mais conhecidos pela participação no futebol profissional, só como Tigres).
A rivalidade universitária foi capaz de grandes feitos. Em 1952, o governo mexicano construiu um grande estádio dentro da Unam. O primeiro evento foi uma competição de atletismo juvenil, mas o primeiro jogo de competição não foi com o futebol, foi a final da liga universitária de futebol americano entre Unam e Poli. Os Pumas venceram por 20 a 19 diante de 90 mil torcedores, público que jamais foi igualado, nem pelos Pumas do futebol, nem pela cerimônia de abertura ou competições de atletismo dos Jogos Olímpicos de 1968.
Em 1970, outra marca, ainda mais impressionante: 120 mil pessoas apinharam o estádio Azteca para ver Pumas 24 x 13 Burros Blancos. São 13 mil torcedores A MAIS que o de Brasil 4 x 1 Itália na final da Copa do Mundo, disputado no mesmo estádio apenas seis meses antes, e um público maior que o de qualquer partida da história da NFL.
Curiosamente, a força do futebol americano universitário do México não se transferiu ao profissionalismo, com ligas que não atraem muito público e sofrem para se manter. A mais importante de hoje, a Liga de Fútbol Americano Profesional (LFA) foi criada em 2016 e é, na prática, semiprofissional. Como o esporte ficou muito ligado à comunidade universitária, ele vive em torno das instituições. E, também por isso, teve raízes mais fortes nas cidades em que há essas grandes escolas, em geral as capitais estaduais e o Distrito Federal.
De qualquer modo, isso ajudou a tornar o futebol americano uma parte da vida esportiva do mexicano há gerações, ao contrário do que ocorre no Brasil, onde o crescimento é significativo, mas recente. Por isso, não soa estranho ver que a NFL tem alguns jogos transmitidos por TV aberta (a maioria ainda é por assinatura). Muito menos que a principal manchete do Récord, principal jornal esportivo do país, na última segunda não era o Campeonato Mexicano de futebol, mas o field goal perdido por Cody Parker no último lance de Chicago Bears x Philadelphia Eagles.
Fonte: Ubiratan Leal
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