A dor e a delícia do Neymarcentrismo
A atuação de Neymar não foi nem de longe o fator determinante para o resultado da final da última Champions League e, portanto, considerando que seu time foi derrotado, essa não é uma afirmação negativa para o atacante brasileiro. Se ele não foi capaz de fazer com que seu time vencesse, tampouco foi o responsável pela derrota.
Havia do outro lado um time melhor que o PSG, jogadores também muito bons, um técnico de trabalho notável na temporada e uma camisa com peso e tradição bem maiores que o do novo-rico time parisiense. Além disso, no esporte, para que alguém vença um outro terá que perder.
O problema é que, por aqui, Neymar torna-se a notícia principal mesmo quando ele não é notícia. É o cara que faz nota de rodapé virar manchete. Cobrir e analisar jogos importantes sob o prisma de um único jogador não é uma prática exclusivamente brasileira, claro. Ou será que a abordagem da final em território polonês não terá sido majoritariamente em torno de Lewandowski?
Nessa final, porém, o Neymarcentrismo extrapolou limites por aqui. Não só porque a ligação do Brasil com o futebol ao menos supostamente deveria gerar mais interesse por um grande jogo fossem quais fossem os personagens, mas principalmente porque, ainda que uma abordagem patriótica seja compreensível, além de Neymar havia outros quatro brasileiros em campo, dois ou três deles com histórias e motivos para roubar algumas das tantas manchetes dedicadas ao atacante após a final.
A desolação de Neymar, vice-campeão da Champions League
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A ânsia de ver Neymar ser eleito o “melhor do mundo”, aliada a uma tendência brasileira para buscar heróis e vilões que justifiquem nossos triunfos e quedas, tem parcela importante nessa abordagem. Mas ela se deve, também, ao fato de que ao próprio Neymar desfruta, lucra e alimenta-se como poucos jogadores de sua figura midiática.
Quando, no mesmo dia de um jogo decisivo da Champions, Neymar fica atento e reage a um movimento de internet ostentando seu moicano, quando interpreta como um ator o papel que crê lhe caber ao sair do ônibus antes da final, cada vez que tikitoka nesse contexto para saciar a fome da legião de moicanos das redes ele desperta amor e ódio, faz tilintar sua inquieta caixa registradora e chama para si o protagonismo pelos resultados, bons ou ruins, para o bem e para o mal.
Manchetes à parte, porém, sua demonstração de talento e seu bom futebol têm tido variação pequena e se mantêm em altíssimo nível ano após ano. E está claro que, neste 2020, sua mudança mais relevante se deu no aspecto comportamental. Afinal, por mais que possamos até duvidar de uma transformação em seu âmago, é indiscutível que seus atos mudaram e que ele tem no mínimo se controlado para não prejudicar seu time e a si próprio.
O que não muda, e provavelmente não mudará nem mesmo quando Neymar se aposentar, será sua enorme porção midiática, sua capacidade de gerar reações que variam do ódio irracional à paixão cega, reflexos de seu carisma, de sua alienação e de tantas outras qualidades e defeitos que compõem uma fórmula potente, transformando-o, no Brasil, em protagonista de tudo que envolver seu nome.
Sendo assim, se cada um sabe mesmo a dor e a delícia de ser o que é, Neymar não deve se incomodar ao ver, ainda que injustamente, a derrota ser atribuída à sua atuação. Porque o mesmo aconteceria em caso de vitória.
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