'Maior que Beckham', Neymar pode se pagar no PSG, avalia especialista em fair-play financeiro
E o fair-play financeiro? Esta é uma pergunta frequente quando se fala na possível contratação de Neymar pelo Paris Saint-Germain, que pagaria ao Barcelona os 222 milhões de euros da cláusula de rescisão. Seria a maior transferência da história, e de acordo com um especialista na regulamentação da Uefa ela pode caber no bolso do clube francês.
Responsável pelo site Calcio e Finanza, especializado em negócios do futebol, Giovanni Armanini lembra que o objetivo do fair-play financeiro não é colocar um limite nos gastos com transferências, mas garantir que os clubes gastem dentro de suas possibilidades de receita.
"O FPF não coloca nenhum teto no que você pode desembolsar em contratações", afirma Armanini. "O que ele limita é o gasto com salários, que tem de ser equivalente a no máximo 70 por cento do que o clube arrecada. O PSG na última temporada gastou 54%, tem muita margem, considerando ainda que o faturamento deve aumentar. Já o Barcelona está no limite, ainda por cima depois de renovar com Messi".
A regra da Uefa determina que o clube não pode acumular um prejuízo superior a 30 milhões de euros num espaço de três anos. "O PSG fechou a última temporada com 10 milhões de lucro. Em tese ainda poderiam perder 40 milhões. Se tiverem 10 milhões de lucro novamente, poderiam perder até 50 milhões na outra", justifica o especialista.
Embora o PSG conte com o forte investimento do Qatar, valores de patrocínio injetados no clube por empresas dos donos ou ligadas a eles nunca podem superar os 30% do faturamento. "Muita gente fala em valores malucos", argumenta Armanini. "Para mim não são malucos se você tem o faturamento para se bancar. O PSG está aumentando sua presença no exterior. No Brasil tem mais seguidores de Facebook que na França. Imagine com Neymar e meia seleção brasileira..."
Com a Copa do Mundo de 2022 no Qatar, contar com uma das estrelas do torneio seria essencial para gerar mais patrocínios e acordos comerciais. Para o editor do Calcio e Finanza, Neymar é exemplo de um jogador desde o início idealizado como marca, algo que David Beckham foi no passado.
"Neymar como Beckham? Pode ser muito mais. O mercado do marketing esportivo cresceu muito em quinze anos", diz. "Na Ásia seguem o futebol como o cinema de Hollywood. Seguem os jogadores mais do que os clubes. Alex Ferguson escreveu que Beckham foi o primeiro jogador planejado primeiro como marca, depois como jogador. Neymar faz algo semelhante".
Armanini acredita que as consequências possíveis de contar com Neymar possam compensar um investimento que, entre contratação, salários e comissões, pode significar um gasto de 80 a 90 milhões de euros por ano.
"Não é por se tratar da multa que o PSG não possa conseguir uma condição mais favorável de pagamento, espalhando os valores em seus balanços anuais. A Juventus, por exemplo, pagou Higuaín (ao Napoli) em duas parcelas, uma em cada ano", lembra. "E se o PSG vende um ou dois jogadores, o saldo deste mercado ficaria negativo não em 222 milhões, mas em 160, por exemplo. Tem quem gaste isso em vários jogadores. Em um é mais arriscado, mas é a avaliação esportiva".
Quando contratou Cristiano Ronaldo, Kaká e Benzema, entre outros, no mercado de 2009, o Real Madrid ficou com um saldo negativo de 170 milhões de euros na janela. "E tinha um faturamento menor que o do PSG hoje", lembra Armanini. "Hoje os times de Manchester fazem com normalidade mercados de 150 milhões. Podemos discutir, mas não dizer que não é sustentável".
Tudo isso significa, então, que o fair-play financeiro fracassou em seu objetivo? O fato é que a Uefa, através de seu presidente Aleksander Ceferin, já pensa em maneiras de alterar sua regulamentação para se adaptar a estes tempos. Desde um imposto sobre grandes contratações (já utilizado na China) até o estabelecimento de tetos salariais, passando pela limitação do tamanho dos elencos.
"Ceferin foi eleito pelas federações menores e tem uma missão: aumentar a competitividade do futebol europeu. Mais que frear investimentos como Neymar, ele deveria equilibrar o futebol. Talvez com tetos salariais que não sejam percentuais de faturamento, mas valores fixos. Assim, eu sei que se contratar Neymar terei de 'cortar' outros jogadores", exemplifica o analista.
"O mercado do futebol foi criado em um contexto hiperliberalista. É muito difícil intervir. Se você coloca um teto, causa mudanças no mercado. Toda mudança tem seus efeitos colaterais. Quando a Uefa passou a exigir jogadores formados nos clubes ou nos países dos clubes, o preço dos jogadores ingleses disparou", lembra. "Ou você cria um outro sistema do início, como nos esportes americanos, ou as correções serão sempre difíceis. Mesmo as ideias justas têm suas consequências".
- E o Milan?
Também se fala muito em fair-play financeiro a respeito da nova administração do Milan, que já contratou dez jogadores para a temporada e ainda busca um centroavante de peso. O chinês Li Yonghong recorreu a um empréstimo com o fundo de investimentos Elliott para finalizar a compra, e precisa devolver 300 milhões de euros em 18 meses.
"Ele diz ter investidores estrangeiros para cobrir a cifra. Caso isso não acontecer, um plano B é o refinanciamento da dívida ou a entrada do clube na Bolsa de Valores", esclarece Armanini. "É importante lembrar que a dívida não é do clube, é de Li. As dívidas do Milan foram zeradas na compra, e foi disponibilizado um orçamento de 55 milhões para o mercado. Como gastaram quase 200 milhões? São negociações parceladas, ou empréstimos com compra fixada".
Ou seja, o Milan precisa alavancar suas receitas. Em outubro, haverá um encontro com a Uefa para alinhar os planos de crescimento dentro do fair-play financeiro, algo oferecido a clubes com novos donos ou que apresentam projetos de aumento de investimentos - desde que justificados. A ideia é obter o "voluntary agreement", ou acordo voluntário, que precisa ser seguido à risca.
"É necessário tornar o Milan rentável. Obviamente precisam chegar à Champions League, é uma centena de milhões de mais. O Milan tem uma marca forte, pode aumentar suas receitas de patrocínio na China e no mundo. É isso que vão dizer à Uefa: era inevitável gastar para aumentar o nível. É arriscado, mas não há outra alternativa no futebol de hoje para alcançar resultados em dois, três anos", diz o especialista.
E o próximo passo, na avaliação de Armanini, é fazer mais dinheiro com venda de jogadores: "Alguém vai pagar a multa de Donnarumma. Outros vão se valorizar e também serão vendidos. A Juventus faz isso. Clubes como Arsenal, Liverpool, Tottenham também fazem. Se você tem um jogador de 100 milhões, você vende. Nem todos são Real Madrid ou Barcelona".
A rival Inter, também adquirida recentemente por chineses, vive outro tipo de cenário com a Uefa. Através de um "settlement", ou acerto, aceitaram penas menores como multa e redução de inscritos nas competições europeias para evitar punições maiores, desde que alcançassem metas de balanço: prejuízo máximo de 30 milhões de euros até o fim da temporada 2015/16 e prejuízo zero em 2016/17.
Para se manter na linha, a Inter precisa repetir no mínimo o "zero a zero" no balanço em 2017/18. Pelo fato de o "settlement" já estar em andamento quando a nova direção assumiu, o clube ficou impedido de aderir ao acordo voluntário.
Fonte: Leonardo Bertozzi
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