Muitos gols e muita história para contar em um clássico armênio
Pela sexta rodada do Campeonato Armênio, oficialmente Armenian Premier League, o Ararat Yerevan recebeu o Alashkert, no sábado, e venceu por 3 a 2. Foi a quinta vitória da equipe na temporada, e que manteve o rival ainda sem somar três pontos, mas com duas partidas a menos. Muito além do futebol, vale conhecer um pouco mais sobre a história da dos dois clubes e, consequentemente, compreender melhor a formação da própria nação.
O Alashkert tem história única e ligada à geopolítica da região. O clube foi fundado em 1990 na cidade de Martuni, na província armênia de Gegharkunik. Seus fundadores foram descendentes de refugiados do Genocídio Armênio, cometido pelo Império Otomano durante a Primeira Guerra Mundial, que viviam na cidade de Eleskirt, à leste do território turco. O nome do clube tem origem na cidade turca de onde partiram seus fundadores.
O Genocídio Armênio é motivo de disputa internacional entre Turquia e Armênia. Atualmente, 33 países, entre eles o Brasil, reconhecem a morte de cerca de 1,5 milhão de armênios como um genocídio. O Governo Turco, herdeiro histórico e cultural dos otomanos, permanece com a alegação de deportação em um período de guerra. Os relatos de mortes, estupros e assassinatos em massa de homens, mulheres e crianças são aterrorizantes e podem ser encontrados em pesquisas um pouco mais aprofundadas sobre o tema. Há gerações de armênios espalhadas pelo mundo, em variados países, por conta dos conflitos no início do século passado.
Na década de 1990 o Alashkert chegou a fechar as portas, mas a partir da chegada do empresário Bagrat Navoyan, em 2011, e a mudança para a capital Yerevan, dois anos depois, o clube mudou de tamanho. Foram quatro campeonatos nacionais conquistados, incluindo a temporada passada, além de uma Copa. O investimento possibilitou também a contratação de jogadores estrangeiros como o lateral-direito brasileiro Tiago Cametá, ex-Ceará, que defende o clube desde o ano passado e foi titular contra o Ararat Yerevan.
Os clubes da capital dominam o futebol armênio, ao todo sete das dez equipes da primeira divisão - disputada em quatro turnos, com 36 rodadas - são de Yerevan. Historicamente, o Shirak, de Gyumri, segunda maior cidade do país, sempre competiu com o Pyunik pela soberania. No entanto, seu último título foi em 2012-13. De lá para cá, apenas representantes de Yerevan foram campeões.
Se Alashkert remete à história da Armênia, Ararat é outro termo importante para o país e que nomeia, além do Ararat Yerevan (fundado em 1935), também o Ararat-Armenia - líder do campeonato com 100% de aproveitamento após seis rodadas e bem mais novo (2017). A referência é, na verdade, gerográfica, já que o Monte Ararat é um vulcão composto e inativo, localizado na fronteira de Turquia e Armênia. Há referências bíblicas à região que tratam o local como último paradeiro da Arca de Noé e também descrito como "montanhas de Ararat", em Gênesis 8:4. Trata-se do principal símbolo da Armênia, presente também no brasão de armas do país. Historiadores armênios entendem que o significado de "Ararat" seja "terra da criação".
Em campo, no estádio Republicano Vazgen Sargsyan ainda sem torcida, o atacante bósnio Aleksandar Glisic abriu o placar do clássico para o Alashkert aos 29 minutos, de cabeça. No ataque seguinte, porém, o marfinense Serge Deblé empatou com um lindo chute na entrada da área e virou para o Ararat aos 44. Sua expulsão aos 25 minutos da segunda etapa aumentou a emoção da partida, que era dominada pelo Alashkert em busca do empate. As esperanças sumiram seis minutos depois, quando outro marfinense, Dognimani Silué, fez o terceiro para os donos da casa. O português José Embaló ainda descontou nos acréscimos e definiu o placar em 3 a 2, cobrando pênalti.
O título armênio em 2020-21 colocou o Alashkert na primeira fase qualificatória da Champions League, onde a equipe empatou na ida com o Connah's Quay Nomads, no País de Gales, em 2 a 2, e depois garantiu a classificação na volta ao vencer, na prorrogação, por 1 a 0. A segunda fase foi mais dura, e o clube acabou eliminado pela sensação Sheriff Tiraspol, que avançou até a fase de grupos da Champions. Enviado então para a terceira fase qualificatória da Europa League, o Alashkert surpreendeu o Kairat, do Cazaquistão e de Vágner Love, com uma vitória por 3 a 2 em casa e na prorrogação, na volta após empate em 0 a 0. Nos playoffs, bateu na trave: derrota por 1 a 0 para o poderoso Rangers, na Escócia, e depois empate sem gols na Armênia. A histórica campanha, de qualquer modo, garantiu vaga na fase de grupos da Conference League, onde enfrentará Maccabi Tel Aviv-ISR (já nesta quinta-feira), LASK-AUT e HJK-FIN.
Apesar das melhores condições financeiras, a estrutura do Alashkert é muito simples, bem distante, por exemplo, de clubes médios brasileiros. Foi o que relatou ao blog, em entrevista no ano passado, o lateral-esquerdo Bryan, ex-Ponte Preta e América-MG, que passou pelo time na última temporada e atualmente defende o Atyrau, do Cazaquistão. "A estrutura é muito abaixo. O presidente é aquele cara que diz que a preocupação dele é pagar e você tem que jogar. Ou seja, não se preocupa com coisas básicas, mas que fazem diferença. Houve um amistoso em um dia muito quente, e pedimos para molhar o campo para a bola rolar mais, já que nosso time tem mais qualidade que os adversários. Ele nos disse que não molharia, porque ia estragar a grama. Quando acabou o amistoso, ele ligou a irrigação", lembra Bryan. "A qualidade do jogo é bem inferior ao Brasil. Penso que se os times daqui jogassem a Série C, passariam dificuldade. A diferença é muito grande".
Muitos gols e muita história para contar em um clássico armênio
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