Como um zagueiro com apenas três jogos virou o grande exemplo do futebol nesta terrível temporada
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Há dois dias, questionado sobre as consequências da pandemia do COVID-19 no futebol, o renomado técnico italiano Carlo Ancelotti afirmou em contundente entrevista ao jornal Corriere dello Sport: “Será um futebol mais verdadeiro. Quando tudo isso acabar haverá um redimensionamento geral: técnicos e jogadores ganharão a metade, o preço dos ingressos vai cair, as TVs pagarão menos e talvez seja tudo melhor”.
Para muitos, utopia. Para outros, exagero. Entretanto, passaram apenas algumas horas após a publicação da entrevista de Ancelotti para que chegasse, também da Itália, uma notícia surpreendente: a Juventus de Turim, clube mais poderoso do país e um dos maiores do mundo, conseguira convencer seus jogadores a abrir mão de receber nesta temporada os salários dos meses de março, abril, maio e junho.
Aqui é bom explicar, não significa que a Juventus deixará de arcar com os cerca de 90 milhões que significam a soma desses quatro meses de vencimentos: 62,5% desse total ainda será pago, mas só na próxima temporada – o que ajuda o clube a evitar não apenas um déficit considerável, mas também, se não houver mudança nas regras (algo improvável), problemas com o Fair Play Financeiro da Uefa.
Como a Juventus conseguiu uma façanha do gênero? Como convenceu jogadores a abrirem mão de boa parte dos salários a que tinham direito é uma pergunta que não apenas torcedores, mas certamente muitos dirigentes de diversos clubes pelo mundo devem estar se fazendo neste momento. A resposta tem nome e sobrenome: Giorgio Chiellini.
O zagueiro e capitão da Juventus e da seleção italiana, hoje com 35 anos de idade, não é uma figura comum no meio do futebol. Além da indiscutível qualidade técnica e liderança (com enorme simpatia), Chiellini formou-se em Economia e Comércio pela Universidade de Turim em 2010, recebendo a nota 109 para um máximo de 110. Não satisfeito, tornou-se mestre em Administração de Empresas, curso concluído em 2017 – desta vez, porém, com a nota máxima possível.
Foi essa figura com atributos improváveis o responsável pela articulação de redução salarial na Juventus. Devido à confiança e ao prestígio que tem entre os colegas, suas argumentações técnicas e embasadas não soaram falsas ou patronais e foram vistas como explicações lógicas a respeito de uma mudança necessária não só para a Juventus, mas, como disse Ancelotti, para o universo do futebol.
Relata a imprensa italiana que Chiellini falou diretamente com seus companheiros de time, iniciando os contatos com os chamados “senadores”, os mais experientes do elenco, como Buffon, Bonucci, Khedira e, claro, Cristiano Ronaldo – cuja redução de vencimentos para esta temporada ficará em pouco mais de 10 milhões de euros. A partir daí, seguiu explicando para os demais, caso a caso, porque o esforço se fazia necessário.
E foi assim que o respeitado zagueiro com apenas três jogos e um gol no atual Campeonato Italiano, vítima de um rompimento de ligamento em agosto de 2019, tornou-se o grande nome da Juventus (e não só) nesta temporada. Chiellini mostrou que com honestidade, respeito, confiança e bons argumentos técnicos é possível, sim, começar a transformar o futebol mundial a partir da crise do coronavírus.
Não se trata, evidentemente, de afirmar que a conta tenha que ser paga pelos jogadores. Eles são só uma parte de toda a engrenagem e, claro, uma ínfima parcela recebe salários como os que recebem os jogadores da Juve: para se ter uma ideia, só na Itália, os 90 milhões de euros que o clube poupará na temporada seriam suficientes para quitar o ano todo dos salários de 16 entre os 20 times da Série A.
O exemplo, portanto, não é apenas – e talvez seja menos – para os jogadores de futebol do planeta. “O exemplo da Juventus é um exemplo para todo o sistema do futebol”, afirmou o presidente da Federação Italiana, Gabriele Gravina, ao saber do feito de Giorgio Chiellini.
De fato, o exemplo está aí. Mas seria mais fácil aplicá-lo se tivéssemos mais Chiellinis no tal “sistema do futebol”.
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