Assédio nos tatames (parte 3): Dentro ou fora?
Clique nos links para ler os capítulos anteriores do especial:
Parte 1 – Introdução
Parte 2 – A culpa não é da mulher
Sim, os assédios ocorrem dentro e fora do tatame. Creio que por ser um esporte tipicamente masculino, os homens não têm muito discernimento do que é ou não assédio, porém nosso papel é conscientizar e, mais que isso, fazer com que os homens já conscientizados mudem a cabeça dos “não conscientizados” também. Sabemos bem que um homem escuta de forma mais receptiva quando outro homem fala, por isso o papel deles é fundamental aqui.
"(…) Sinto muita falta da presença feminina nos treinos, quando vou competir percebo a diferença nas posições e no jeito de rolar, porém ocorrendo situações como estas, dificilmente a presença delas se consolidará. E nosso esporte possui muito contato físico, encostamos em órgãos sexuais sim, assim como todo o restante do corpo, com apenas o intuito de pontuar e finalizar. Durante o rola, nosso pensamento fica em busca das transições que o jiu-jitsu proporciona e nada mais! Caso o parceiro(a) não esteja com o mesmo pensamento, significa que ele(a) não está lugar certo, para isso sugiro que procure um bordel e não um tatame."
Dito isso, temos mais um choque: segundo a pesquisa, 48,4% das mulheres relatam ter sofrido assédio no tatame e apenas 18,6%, fora dele.
“O mestre me chamou no WhatsApp porque iria graduar meu esposo e queria que eu comprasse a faixa roxa. Aí eu disse que ok. Ele me disse em seguida que minha faixa azul eu pegaria com ele quando fosse treinar sozinha."
"Uma amiga havia começado a praticar jiu-jitsu e como ela trabalhava em outra cidade, procurou um local para treinar. Ela conheceu um cara que ensinava jiu-jitsu na cidade onde ela trabalhava e começou a conversar com ele pelo chat do Facebook para saber mais sobre o trabalho que ele desenvolvia. Em uma das conversas, ele começou a dizer que o objetivo dela em treinar jiu-jitsu era de se agarrar com ele e tal. Ela ficou muito decepcionada e também assustada, ele trabalhava com crianças e ficou imaginando como ele deveria tratar suas alunas e qual o perigo que elas correm. Os laços foram cortados e ela deu uma bronca nele sobre sua postura de professor e sobre o assédio. No final, ela teve que parar de treinar por falta de tempo e de local adequado.”
O que tenho a dizer de quem assedia dentro do tatame: caro, você não entendeu o que é jiu-jitsu. O que é uma pena, porque o esporte é deturpado por conta de meia dúzia de pessoas que não sabem o que estão fazendo lá.
Já aconteceu de namoradas dos meus amigos de tatame contarem que não se sentem confortáveis em ver seus parceiros rolando com mulheres. Como já falamos, é muito difícil entender o jiu-jitsu para quem está de fora, porque algumas posições podem parecer estranhas diante dos olhos de uma pessoa leiga, devido ao contato intenso. Mas precisamos respeitar e sermos respeitadas para que não haja nenhum tipo de desconforto.
Outra coisa que também já ocorreu foram relatos de homens, do meio do jiu-jitsu mesmo, se sentirem desconfortáveis em aceitar que sua parceira treinasse fora da academia ou sem a presença dele, já que “não confia nos caras”. Então, pessoas, vamos pensar melhor na hora de assediar uma mulher para que nosso esporte possa crescer e se desenvolver cada vez mais. Se você está no jiu-jitsu unicamente para abusar de uma mulher, você não é digno de habitar aquele lugar (e nem nenhum outro, na verdade).
E para quem assedia fora do tatame, o papo vai um pouco além. Dentro do jiu-jitsu, aprendemos regras e disciplinas que podemos levar para a vida. Tudo agrega muito. Mas não podemos culpar o jiu-jitsu pelo péssimo hábito de pessoas que, com o perdão do clichê, “não tiveram educação em casa”. Sim, educação vem de berço, é um conjunto de costumes… Mas, sim, nós podemos ajudar na desconstrução também.
É uma pena ter que falar ainda sobre esse tipo de coisa, mas se você está a fim de alguém que treina com você, tudo bem, isso não é nada demais e pode acontecer. Espere acabar o treino, converse com a pessoa como alguém civilizado e não chegue com aquele tipo de “elogio” babaca. E lembre-se: não, é sempre não.
Aos mestres que insistem em abusar de seu poder para dar em cima das suas alunas: parem. Você ter uma faixa preta amarrada na cintura diz que você persistiu, mas não que você pode tudo. Você não é livre para assediar pessoas hierarquicamente subordinadas por sua posição de professor e mestre, e suas alunas não são sua propriedade. Também não é um crime um professor sair com uma aluna. Afinal, fora do tatame somos seres comuns, com necessidades, desejos e, sim, é completamente normal paquerar e, mais ainda, se envolver com pessoas do jiu-jitsu por ser o nosso mundo. Mas tudo de uma forma completamente natural e com consentimento. Senão, nada feito.
Embora não seja um assédio direto, mas algo que pode incomodar é o fato de toda vez que uma menina nova chega para treinar rolarem diversos comentários. Sim, somos poucas e quando chegamos para treinar, é normal que a atenção esteja voltada para nós. Esse tipo de ação não atrapalha se feita de forma respeitosa, mas do contrário, podem acabar sendo desconfortáveis para quem ouvir. Não é legal falar que “nossa, imagine que legal tomar um triângulo dela” (o triângulo é um golpe que a cabeça fica literalmente entre as pernas de quem está aplicando) porque isso também é falta de respeito com todas as pessoas que praticam a arte, um comentário desse tipo dá a entender que em um triângulo é possível se aproveitar de alguém, isso deixa todas as pessoas suscetíveis a um assédio, por isso cuidado com o que você fala. Homens, não tolerem esse tipo de comentário! Não é feio tentar corrigir seu amigo. Faz bem para a arte!
Semana que vem vamos falar de assédio moral, que era algo que eu não tinha pensado de imediato, mas que recebi muitos relatos sobre. Então, até lá. E lembrem-se: elogie nossa guarda e não o nosso corpo!
Fonte: Mayara Munhos
Assédio nos tatames (parte 3): Dentro ou fora?
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