Organizadas, dirigentes, governo e polícia: quem é pior? A violência seguirá
Foram poucos dias e um único jogo. Mas todos os episódios que antecederam e sucederam o clássico entre Palmeiras e Corinthians, no último domingo, sintetizaram de maneira precisa as diversas faces do problema que há tantos anos assola o futebol brasileiro. Repare só:
O EPISÓDIO NO METRÔ
Nada mais que o básico: sábado à tarde, 40 e poucos covardes (a maioria absoluta com camisa da principal organizada corintiana) são flagrados e filmados depredando o metrô e espancando quatro torcedores do São Paulo. Eles são detidos pela polícia e, minutos depois, fotografados em uma cena que lembrava alguns moleques desobedientes tomando bronca da diretora numa escola primária (inclusive um tipo de Rambo que batia no peito, muito macho, no vídeo do metrô). Três ou quatro pagaram fiança, o resto não precisou nem mesmo disso, e todos foram rapidamente liberados, em tempo de, provavelmente, se dirigirem ao clássico no Allianz Parque no dia seguinte, para quebrar algumas cadeiras.
A COLETIVA DE GOBBI
o presidente corintiano, em coletiva mais lúcida que o habitual, se coloca compreensivelmente contra a torcida única no dérbi. Só ameaça perder a linha quando alguém lhe pergunta sobre qual seria o destino dos 1.800 ingressos que seu clube poderia conseguir. A venda das entradas seria aberta aos torcedores comuns ou, como de praxe, elas seriam destinadas à torcida organizada que por tantas vezes, inclusive após suas ações mais vergonhosas, contou com o apoio, a condescendência ou as vistas grossas do então presidente corintiano? O processo de distribuição não ficou claro (porque ele não respondeu), e o que seu viu no estádio foi uma proporção enorme de camisas dos "organizados" para um número bem inferior de camisas do Corinthians.
OS INTERESSES DE NOBRE
Assim como ainda não se pode afirmar que Gobbi, neste caso específico, destinou seus ingressos para as organizadas, não é possível afirmar que Paulo Nobre, ao defender o clássico com torcida única, tivesse como principal objetivo evitar o prejuízo com o qual arcaria por fechar um setor do estádio para garantir a segurança dos "torcedores" adversários — mas, segundo Gobbi, foi o que o próprio Paulo Nobre lhe disse. De qualquer maneira, o episódio é emblemático de um tipo de prática cada vez mais comum no futebol, o predomínio absoluto dos interesses comerciais (cuja importância não se discute) em detrimento do espetáculo.
O DESPREPARO DA PM
Antes do jogo, alguns poucos bandidos da mesma espécie do episódio ocorrido no metrô, só que desta vez palmeirenses, provocam e exigem da Polícia Militar o uso da força. Ok. O que se vê, contudo, é o uso da força aleatório e indiscriminado: sem preparação (e talvez até sem número, como mostra esta matéria) e incapaz de agir apenas sobre os responsáveis pelos crimes, a tropa de choque sai atirando bombas em torcedores que caminham tranquilamente para o estádio ou que conversam pelos arredores do Allianz Parque — ninguém me contou, eu vi. Famílias desistem de ir ao jogo e prometem nunca mais voltar a um clássico.
O ESTÁDIO QUEBRADO
Ao fim da partida, como já ocorrera com a Arena Corinthians quando visitada pelos torcedores palmeirenses, constata-se que várias cadeiras, assim como outros itens do estádio, foram depredados pelos torcedores visitantes. Um dia antes, a principal organizada corintiana, maioria absoluta no setor da depredação, havia se manifestado publicamente contra esse tipo de violência. É algo comum quando se trata das organizadas: por ma fé ou por falta de controle sobre seus integrantes, o discurso é um, a prática é outra.
A AÇÃO E A REAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Primeiro, foi o esforço para que o jogo ocorresse com torcida única, clara admissão do despreparo e da incapacidade do poder público para proteger os inocentes e identificar, prender e manter presos (pelo menos nas horas de jogos) os "torcedores-bandidos". Depois, a solução para todos os eventos bizarros ocorridos antes, durante e depois do clássico: processar os clubes. É esta toda a intervenção que se vê do poder público em relação a um problema que, convenhamos, já não é novidade há muito tempo.
Com bandidos reincidentes sempre livres, dirigentes mais (ou apenas) interessados em política ou dinheiro, uma polícia militar despreparada, as organizadas esbanjando hipocrisia e a incompetência do governo e da justiça, a solução para a violência no futebol parece estar longe, muito longe.
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