A possível saída de Luís Castro é um dos maiores pecados já vistos no Botafogo e no futebol brasileiro
Eu falei na semana passada, antes de Palmeiras x Botafogo, que Luís Castro está em um momento melhor do que Abel Ferreira. E o grande jogo do fim de semana no futebol brasileiro, a vitória de 1 a 0 do Glorioso sobre o Verdão, quebrando a longa série invicta palmeirense no Allianz Parque, confirmou a minha impressão e o que muita gente não estava pronta para conversar. O trabalho de Luís Castro não é fogo de palha, ele entendeu muito bem a nova fase do tradicional clube carioca, apostou acertadamente em um gramado sintético no estádio Nilton Santos, pinçou reforços que são cirúrgicos, corrigiu a rota de um projeto de SAF que começou gerando alguma desconfiança e críticas contra o próprio técnico.
A campanha insatisfatória no Estadual do Rio
neste ano ajudou na avaliação ruim que muitos fizeram do atual Botafogo, que
está mais organizado em todos os setores. Tenho amigos competentes que foram
trabalhar no time da Estrela Solitária que não tem bem uma estrela solitária em
campo, embora Tiquinho Soares seja o artilheiro com folga do Brasileiro
(responde pela metade dos gols do time no campeonato nacional) e já pinte como ídolo
alvinegro. Eu mesmo não acreditava na liderança duradoura do Botafogo após ver
como sofreu para vencer São Paulo e Bahia nas duas primeiras rodadas. A ideia
de um time reativo que vencia mais pela eficiência ficou para trás. Os principais
favoritos ao título do Brasileiro foram sendo batidos um a um: Flamengo,
Atlético, Fluminense e Palmeiras. O Botafogo mostra em campo de forma exemplar a
organização que exibe fora de campo. Luís Castro foi uma escolha muito acertada
de John Textor, sua boa relação com os superiores e com os jogadores mostra que
ele catalisa tudo.
Nas coletivas, o experiente treinador
português tem dado aula de futebol e até de vida, de comportamento, provocando reflexões.
Tanto que recebeu elogios rasgados de Abel Ferreira, que ganhou fama no Brasil
também por dar aulas em coletivas. “Mandei uma mensagem particular para ele (Luís
Castro), mas agora mando uma pública. Parabéns pelas declarações dele. É uma
pessoa que, quando era treinador do Penafiel, eu ainda era gandula. Fiquei
muito contente pelo o que ele falou, da forma que falou. Se eu tivesse estudado
para fazer um discurso daqueles, não iria conseguir. Espero que alguns de vocês
entendam a profundidade das palavras dele”, afirmou Abel na metade de maio,
quando Castro mostrou aos jornalistas muito do seu caráter. “A minha vida não é
só resultados. Por muito que sejam resultados só para vocês, para mim a vida
não é só resultados. Para mim a vida é trabalho com dignidade. O trabalho com
dignidade deve se sobrepor sempre aos resultados”, ensinou o professor português.
Luís Castro, em um gesto de inclusão, já levou para a coletiva um integrante da comunidade surda, por exemplo. Ressalta muito a honestidade de seu trabalho. E se orgulha por nunca ter sido demitido, coisa que alguns, de forma precipitada, queriam que acontecesse com ele no começo do ano. Não fosse a SAF do Botafogo, fatalmente esse profissional elogiável estaria no olho da rua. O próprio Abel Ferreira, caso raro de treinador mais longevo do que Castro no futebol brasileiro, elogiou a confiança dada pela cúpula botafoguense ao seu treinador. “Os trabalhos longevos têm a ver com quem manda. Dei os parabéns a ele (Luís Castro), mas temos que parabenizar o presidente dele, que sabe do treinador que tem. Mesmo que todos os treinadores fiquem 10 anos nos mesmos clubes, só um vai ganhar. Não sei se é possível mudar essas mentalidades em um espaço tão curto de tempo. Tudo que é cultural, mudança de mentalidade... isso demora décadas. Cada país tem uma história. Não acredito que esse tipo de mentalidade aqui vai mudar tão cedo”, afirmou o palmeirense.
Na vitória na partida que tinha cara de “final”
contra o Palmeiras, Luís Castro tentou cumprimentar Abel, mas esse, que tem
fama de mau perdedor, foi logo para os vestiários, certamente abatido pela
derrota em casa. Não foi algo grave como tomar o celular de um jornalista, mas
é mais uma imagem que não pega bem para Abel, ainda mais pelo fato de o
adversário ser seu conterrâneo e já ter uma idade mais avançada. Com a possível
saída de Castro do Botafogo, Abel continuará sendo o técnico de mais destaque
no futebol brasileiro. Só o experiente lusitano conseguia competir taticamente
e nas coletivas/aulas com o ótimo Abel Ferreira aqui. A perda para o Botafogo
seria colossal, claro, mas o nosso futebol precisa de mais profissionais como
Luís Castro. O dinheiro da Arábia Saudita e o Cristiano Ronaldo são argumentos
fortes para o técnico do líder do Brasileiro (com sete pontos de diferença em
apenas 12 rodadas) deixar o Botafogo, mas sua marca já está muito bem estabelecida
no Glorioso e também no nosso país.
“Ouvi muitas vezes no ano passado que
havíamos gasto muito dinheiro em contratações. Imagina um carro, você não
precisa gastar muito dinheiro se for trocar só um pneu. Quando um carro só tem
o chassi, aí tem que ter quatro rodas, volante, faróis, vidros, é claro que
teríamos que gastar mais. E foi o que aconteceu com o Botafogo. O que queriam
que fizéssemos? Tínhamos que agir ao longo da temporada, mas agir de uma forma
planejada. Tivemos que contratar muito em determinado momento, avaliar,
contratar em função da nossa avaliação e fomos andando até chegar a este elenco.
No começo da temporada, tínhamos problemas. Tinham saído Jeffinho e Júnior
Santos, fizemos entrar Diego Hernández, Júnior Santos e Matías Segovia”,
explicou Luís Castro, certamente o maior acerto de uma SAF no futebol
brasileiro até este momento. O correto português é o empregado ideal para um dono
de clube e um mestre para seus atletas. Hoje, a torcida do Botafogo e a
imprensa aprenderam a respeitar e admirar Luís Castro. Nunca é tarde para
aprender.
A possível saída de Luís Castro é um dos maiores pecados já vistos no Botafogo e no futebol brasileiro
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