O muro e a depressão: o reflexivo final de semana do futebol alemão
Sábado, 9 de novembro de 2019. Berlim volta a ser dividida por um muro.
A parede de 155 km derrubada 30 anos antes fora recriada no centro do campo do Estádio Olímpico, antes de a bola rolar para Hertha x RB Leipzig.
"Juntos contra muros, juntos por Berlim", dizia a mensagem na barreira de poucos metros e que existiu por apenas poucos minutos.
Nada mais de separações. O futebol alemão reflete a sociedade, nos dois sentidos que a palavra tem.
Na crise migratória dos últimos anos, a Federação Alemã, junto com a Bundesliga, começou em 2014 um investimento de ajuda aos refugiados. O brasileiro Cacau, que defendeu a seleção alemã na Copa do Mundo de 2010, foi contratado como encarregado da integração de estrangeiros pela Federação Alemã.
Não é coincidência que a Alemanha tenha sido campeã do mundo com nomes como Mesut Özil, Sami Khedira, Jérôme Boateng, Lukas Podolski e Miroslav Klose, que nasceram em outros países, no caso dos dois últimos, ou que têm origens de outras nacionalidades.
Boa parte da reconstrução do país no pós-guerra se deu pelas mãos de estrangeiros, e as raízes da integração geraram frutos em todas as áreas. Como no futebol.
Com Muro de Berlim antes do jogo, Hertha perde para RB Leipzig pela Bundesliga
Domingo, 10 de novembro de 2019. Por um minuto, o futebol alemão se silencia nas mais diferentes divisões, tendo uma hashtag como mote: #gedENKEminute.
O termo ‘Minuto de recordação’ foi escolhido por fazer menção ao nome de Robert Enke, que dez anos antes cometeu suicídio. O goleiro do Hannover 96, e com passagens por Barcelona, Benfica, Borussia Mönchengladbach, entre outros clubes, possivelmente jogaria a Copa do Mundo de 2010 com a seleção alemã, mas a depressão não deixou.
A doença veio pela primeira vez em 2003, e Enke teve de lutar contra ela - e sem deixar de mostrar uma grande personalidade.
"Se alguém me perguntar depois de 30 anos na profissão quem eu acho que é o profissional ideal, eu sempre digo que Fernando Redondo e Robert Enke. Ambos não eram apenas jogadores especiais, mas pessoas especiais: respeitosas, sociáveis, inteligentes”, disse Jupp Heynckes no livro ‘Uma vida muito curta: a tragédia de Robert Enke’, de Ronald Reng.
Tal postura “especial” foi demonstrada em abril de 2008, quando o goleiro Sven Ulreich, então com 19 anos, recebeu a ligação do próprio Enke após ele ter falhado em um jogo contra o Bayer Leverkusen. “Quando atendi, tive arrepios”, contou o hoje atleta do Bayern de Munique.
Mas "mesmo heróis têm depressão", como disse o nome do evento ocorrido em Hannover em memória aos 10 anos da morte do goleiro.
Em 2006, Robert e sua esposa Teresa perderam a filha de dois anos, que ficou um ano no hospital por conta de problema cardíaco. Meses antes da morte de Enke, o casal tinha adotado uma bebê, mas, com a depressão, ele temia que pudesse perder a guarda da filha se sua doença se tornasse pública. Assim, não encontrou outro caminho se não tirar a própria vida.
Dez anos depois, a memória de Enke segue viva, mas não apenas pela homenagem do último fim de semana.
Desde janeiro de 2010, a Federação Alemã, a Liga Alemã e o Hannover 96, último clube do goleiro, mantêm a Fundação Robert Enke, que tem como propósito ajudar pessoas que sofrem de depressão, assim como de crianças com problemas de coração e seus pais. A presidente é Teresa Enke, que conta com o apoio financeiro das três instituições.
Sejam as barreiras físicas ou psicológicas, o futebol alemão movimenta-se para derrubá-las. Um reflexivo fim de semana dentro mostra o quanto o esporte no país vai além das quatro linhas.
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Fonte: André Donke
O muro e a depressão: o reflexivo final de semana do futebol alemão
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